Embora
grupos como Titãs e Plebe Rude tenham seduzido a juventude
roqueira da década de 1980 com obras contestatórias, é consenso que Agenor de Miranda Araújo Neto (1958 –
1990) e Renato Manfredini Jr. (1960
– 1996) foram os maiores porta-vozes musicais da geração daqueles anos em que o
rock brasileiro esteve com cotação alta no mercado fonográfico. O recém-lançado
livro Brasil - Cazuza, Renato Russo e a
transição democrática (Editora Civilização Brasileira) reflete sobre as
questões políticas e sociais embutidas nos cancioneiros dos dois compositores
cariocas.
Escrito
pelo jornalista Mario Luis Grangeia,
doutorando em sociologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o
livro contextualiza e entrelaça as obras dos dois ícones do rock brasileiro dos
anos 1980.
Egresso
do grupo carioca Barão Vermelho,
formado em 1981 Cazuza aguçou a veia
política na carreira solo iniciada em 1985 e desenvolvida sob os efeitos
devastadores do vírus da Aids. Renato
Russo foi o mentor da banda brasiliense Legião Urbana, formada em 1982 numa cidade então em combustão,
imersa no fogo ateado pelo movimento punk dos anos 1970 com chamas que se
mantiveram altas na capital do Brasil entre 1978 e 1982, anos em que Russo
esteve à frente do grupo Aborto Elétrico.
Russo
é o compositor de Que país é este?,
rock que começou a ser veiculado em shows em 1978, expondo a sujeira até então
varrida para baixo dos tapetes nacionais. Cazuza
é parceiro de George Israel e Nilo Romero na composição de Brasil, o rock que sambou e sapateou na
cara do país em 1988, dez anos depois, na voz da cantora Gal Costa. Granjeia parte destas duas músicas-emblemas para abordar
os cancioneiros de Cazuza e Renato Russo em um país que atravessou
os anos 1980 em processo de redemocratização.
O
autor se vale de trechos de entrevistas concedidas pelos artistas para montar o
painel sócio-político-musical da época. Fatos da vida pessoal dos artistas,
como a homossexualidade e a contaminação pelo vírus HIV, entram em pauta, no
sentido de que também foram questões políticas numa década em que houve quem
caracterizasse a Aids como “peste gay”.
Mesmo
sem apresentar uma visão original sobre as obras postas em discussão, o livro
tem o mérito de dissecar significados e sentidos políticos das músicas de Cazuza e Renato Russo, mostrando oscilações nas visões dos compositores,
cujas ideologias foram da esperança ao desencanto com os rumos sócio-políticos
do Brasil.
Brasil - Cazuza, Renato Russo e a
transição democrática expõe como os dois
roqueiros jamais se calaram diante das mazelas do Brasil, levantando as vozes
(de tenor, no caso de Cazuza, e
barítono, no caso de Renato Russo) contra as injustiças e os
algozes das liberdades democráticas.