Embora
tenha ficado mais conhecido a partir da década de 1980 como o pai do cantor e
compositor carioca Cazuza (1958 –
1990), João Araújo (1935 – 2013) foi
um dos executivos mais poderosos da história da indústria fonográfica do
Brasil. Entre os feitos de Araújo, a aposta em Caetano Veloso e Gal Costa
foi um dos mais importantes – talvez o lance mais decisivo para o futuro da
música brasileira. Caetano e Gal já tinham debutado no mercado fonográfico em
1965 com a gravação pela RCA dos respectivos fracassados compactos. Mas já
pareciam cartas fora do jogo quando Araújo investiu na contratação dos artistas
baianos pela gravadora Philips, da qual era diretor artístico, e na gravação de
um álbum em dupla que apresentasse Gal e Caetano ao mercado e ao Brasil. Nascia
o projeto de Domingo, álbum gravado
e lançado em 1967 que completa 50 anos em 2017 como título atípico nas
discografias de ambos os cantores.
Para
começo de conversa, trata-se do único álbum gravado por Caetano – que na capa
do LP ainda assinou o sobrenome Velloso com o l dobrado da família – antes da
revolução da Tropicália que abriu a mente e a obra do artista. Gal – cujo
sobrenome Costa não aparece na capa – ainda soa como a Maria da Graça, ou simplesmente a Gracinha, devota do mesmo João Gilberto também idolatrado por
Caetano como o papa da moderna música brasileira. Ecos da Bossa Nova de João
reverberam ao longo das 12 gravações formatadas em estúdio pelo produtor Dori Caymmi com arranjos divididos
entre o próprio Dori, Francis Hime e
Roberto Menescal, a quem foi
confiada a orquestração da canção-título Domingo,
composta por Caetano e gravada pelo autor com Gal, num dos três duetos do
disco.
O
primeiro desses três duetos é ouvido logo na abertura do álbum, em Coração vagabundo (Caetano Veloso), canção-síntese
do disco, arranjada por Dori, grande avalista e entusiasta do projeto do álbum
em dupla. Trata-se da música mais conhecida do repertório, ainda que Avarandado (Caetano Veloso), canção
solada por Gal e arranjada por Francis, também tenha passado na peneira do
tempo.
Embebido
em poesia, com alta dose de melancolia, Domingo
é quase um disco autoral de Caetano, que firmava parceria com o poeta Torquato Neto (1944 – 1972) em Nenhuma
dor, canção de amor solada por Gal. Entretanto, a ficha técnica do disco
agregava nomes de outros compositores identificados com a estética cool da
Bossa Nova. Embora logo fosse se tornar um dos mentores da Tropicália ao lado
de Caetano, Gilberto Gil assinava Minha senhora e Zabelê em parceria com Torquato
Neto e ainda sem a semente da eletricidade tropicalista. Já consagrado como
compositor, Edu Lobo era o autor de Candeias, melódica canção perfeitamente
ajustada à voz de Gal, na época ainda contida, mas já de uma beleza única. Já o
compositor carioca Sidney Miller
(1945 – 1980) assinava Maria Joana,
deixando entrever o samba que se ouvia na época na cidade do Rio de Janeiro
(RJ).
Contudo
e com todos, Domingo é
essencialmente álbum do Caetano pré-tropicalista filtrado pela voz de Gal,
bússola do artista neste disco já cinquentenário que se conserva jovial,
merecendo loas e louvações ao longo de 2017.