quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Quando o rock nacional tinha voz na política

Se nos anos 70 os atiradores de elite só podiam disparar por trás das barricadas criadas com poesia e metáforas, na década seguinte eles foram para o front. Mais distantes do AI-5 de 1968 do que a MPB de Geraldo Vandré e Chico Buarque, bem mais próximos da abertura política e das Diretas Já!, a geração dos meninos que criaram as estruturas mais firmes para a existência de um rock nacional sentiu o peso do engajamento. A era de atuação política mais visível na música brasileira girou em torno de um punhado de bandas sobretudo cariocas, paulistas e brasilienses que, há 30 anos, acreditaram que poderiam mudar se não o mundo, ao menos o seu País.

Os Paralamas do Sucesso bateram nos “300 picaretas do Congresso” apontados por Lula, em 1995, oito anos antes de o ex-metalúrgico se tornar presidente da República. A música 300 Picaretas espancava o que havia sobrado de moral nos políticos envolvidos no chamado Escândalo do Orçamento. Um dos versos dava nome aos bois:
Papai, quando eu crescer, eu quero ser anão / Pra roubar, renunciar, voltar na próxima eleição / Se eu fosse dizer nomes, a canção era pequena / João Alves, Genebaldo, Humberto Lucena / De exemplo em exemplo aprendemos a lição / Ladrão que ajuda ladrão ainda recebe concessão / De rádio FM e de televisão / Rádio FM e televisão... Luiz Inácio falou, Luiz Inácio avisou.”

Apenas três anos depois de Luiz Inácio assumir a presidência ao som de 300 Picaretas tocada ao vivo, e de os Paralamas receberam o título de Cidadãos Honorários de Brasília, os ânimos do rock sofreriam um novo golpe. O mesmo partido que contava com o apoio de grande parte da classe artística politizada pagava propina aos parlamentares para que eles votassem a favor de projetos do governo Lula.

Os corredores de Brasília estavam contaminados pelo Mensalão. Sem o mesmo poder de fogo dos anos 80, o rock voltou ao combate com os Titãs, que lançaram Vossa Excelência.

Estão nas mangas / dos senhores ministros / nas capas / dos senhores magistrados / Nas golas / dos senhores deputados / nos fundilhos / dos senhores vereadores / nas perucas / dos senhores senadores...” O refrão era um desabafo: “Senhores! Senhores! Senhores! / Minha Senhora! / Senhores! Senhores! ; Filho da P...! Bandido! Corrupto! Ladrão! Senhores!

O tempo não parece vencer canções que preferiram não citam nomes. Em 1978, Renato Russo escreveu o mais regravado dos libelos, Que País É Esse, que a Legião Urbana só lançaria em 1987.

Nas favelas, no Senado / Sujeira pra todo lado / Ninguém respeita a Constituição / Mas todos acreditam no futuro da Nação".

A censura ainda tinha garras longas o suficiente para impedir que Que País é Este e as faixas Faroeste Caboclo, Conexão Amazônica e Mais do Mesmo fossem tocadas nas rádios.

Sem citar um fato específico, o Ultraje a Rigor parecia citar todos os fatos ao mesmo tempo ao lançar Inútil, em 1985 (um EP havia sido lançado dois anos antes com Mim Quer Tocar do outro lado) – primeiro ano da era José Sarney depois de seis nas mãos do último general, João Baptista Figueiredo. Inútil, em sua mescla de crítica política e autocrítica social, soa com uma contemporaneidade de estremecer:

A gente não sabemos escolher presidente / A gente não sabemos tomar conta da gente / A gente não sabemos nem escovar os dente / Tem gringo pensando que nóis é indigente / Inútil, a gente somos inútil...” “A gente faz música e não consegue gravar / A gente escreve livro e não consegue publicar / A gente escreve peça e não consegue encenar / A gente joga bola e não consegue ganhar.


Cinco músicas politizadas da geração mais indignada do rock nacional:

Legião Urbana - Que País É Esse?

Ultraje a Rigor - Inútil

Plebe Rude - Até Quando Esperar

Paralamas do Sucesso - 300 picaretas

Titãs - Vossa Excelência

Nenhum comentário:

Postar um comentário