sexta-feira, 17 de março de 2017

A patética geração que menospreza e ignora Madonna – Por Wilson Barroso

Muitos fãs de música pop pensam que esse gênero musical tem dez anos de idade ou menos, que foi magicamente trazido ao mundo por algum tipo de divindade musical que pariu todo um estilo de música com um ou dois álbuns que cada fã tem como preferidos.

Esses mesmos fãs alienados massacram Madonna por todas as razões possíveis: alguns acham que ela já está velha demais para a música pop, ou que não faz mais sucesso porque perdeu a habilidade, ou porque simplesmente vive de passado. Ou no fim das contas, simplesmente a acham uma prostituta ridícula, alguém que poderia simplesmente cair no esquecimento.

Mas querendo ou não, esses fãs de música pop que ignoram e desprezam Madonna devem a ela muito mais do que suas estreitas mentes podem imaginar. Simplesmente porque 11 entre 10 cantoras de pop são visceralmente influenciadas pela Rainha do Pop, que é simplesmente o útero que gerou a música pop como conhecemos.

Você provavelmente adora quando sua cantora favorita lança clipe novo, não é mesmo? Se for daqueles fãs mais apaixonados, chega a deixar o vídeo no repeat para gerar visualizações. Espero que esteja ciente que Madonna foi uma das responsáveis por tornar os videoclipes musicais obras complexas, caras e artísticas.

Até o comecinho da década de 80, os chamados clipes nada mais eram que vídeos dos artistas cantando ao vivo. Vendo o potencial que esse formato tinha, Madonna começou a investir nesse formato, sendo "Like a Virgin" (1984) um dos primeiros videoclipes no formato atual, praticamente inaugurando a MTV. E ela não parou por aí, ao longo de sua carreira, a cultura pop foi agraciada por vídeos antológicos, como "American Life" (2003), "Frozen" (1998), "Ghosttown" (2015) e "Bedtime Story" (1994), sendo que este último está no acervo permanente do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA).

Teu coração falta sair pela boca quando sua diva anuncia uma turnê mundial, não é? Ver ao vivo as músicas favoritas, muitos efeitos, cenografia, coreografia, figurino: é sempre um deleite para os olhos. Você deve saber que esse formato de show também foi inaugurado por Madonna, não é?

Até a década de 80, os grandes artistas tinham shows simples, compostos apenas por cantor, banda e quando muito um par de dançarinos. Mas em 1990, Madonna mudou essa chatice, sua "Blond Ambition Tour" inaugurou a era de concertos extravagantes, com muitos dançarinos, efeitos especiais e trocas de roupa. E aparentemente continua boa nisso: ela ocupa três posições no ranking das dez turnês femininas mais lucrativas da história, inclusive o primeiro lugar (a "Sticky & Sweet Tour", que rodou o mundo entre 2008 e 2009, arrecadou 407 milhões de dólares em apenas 85 apresentações).

Todo mundo adora uma música safadinha. De "Drunk in Love" de Beyoncé a "I Kissed a Girl" de Katy Perry, passando por "If U Seek Amy" de Britney Spears: é bem comum hoje em dia que uma música fale de sexo de forma mais aberta. Mais um crédito pra Madonna.

Sempre houve música sobre sexo, embora até os anos 80 fosse de forma velada, implícita ou atenuada. E quem foi responsável por desvelar a própria sexualidade e liderar a revolução sexual feminina na música? Madonna de novo, com o lançamento de "Justify My Love" (1990, considerado pesado a ponto de ser barrado pela MTV) e do álbum "Erotica" (1992, onde se fala sobre sexo de uma maneira extremamente elegante, e nada vulgar. Pena que não se pode dizer o mesmo sobre toda música pop que toca nesse assunto hoje em dia, não é mesmo?).
Mas às vezes vocês só querem mesmo dançar como se não houvesse amanhã, com um umas músicas cheias de sintetizadores e batida eletrônica, como se faz hoje em dia, não é? Dou uma trufa de leite ninho pra quem adivinhar quem foi responsável por trazer a música eletrônica pro mainstream. Pois é, Madonna de novo. O mainstream não tinha influências diretas da música eletrônica, até que veio ao mundo "Ray of Light" (1998), que encheu as rádios com sintetizadores e gravações digitais em hits como "Frozen", "Nothing Really Matters" e a homônima "Ray of Light", de uma forma bem mais orgânica e elegante que certas músicas de pendrive que abundam hoje em dia.

Talvez você tenha arrepios quando vê que sua favorita bateu a marca de um milhão de cópias vendidas mundialmente, não é? E é provável que adore desmerecer Madonna porque seus últimos dois álbuns não venderam tão bem (entre aspas, pois nenhum deles vendeu menos de um milhão mundo afora). Se você usa charts e vendas como padrão de qualidade, talvez deva reconsiderar essa artista, já que ela tem quatro álbuns que venderam mais de VIN-TE milhões no mundo: "Like a Virgin" (1984), "True Blue" (1986), "Ray of Light" (1998) e a compilação "The Immaculate Collection" (1990), sendo que essa última, vendendo mais de TRINTA E CINCO milhões de cópias, é o álbum de compilação mais vendido da história). No total, já são mais de 320 milhões de álbuns vendidos no mundo tudo e 46 #1 na Billboard Dance Club Songs, dois recordes absolutos.

O pop normalmente foca em temas universais e seus desdobramentos, como amor romântico, solidão, ciúme, vontade de dançar e se divertir, além de sexo, claro. Mas além desse lugar comum, Madonna ousa, escrevendo e cantando sobre religião ("Devil Pray" e "Like a Prayer"), AIDS ("In This Life"), mundo dos sonhos ("Bedtime Story"), família ("Inside of Me", "Oh Father", "Promise to Try") e claro, crítica social de verdade ("Swim", "American Life", "Hollywood", "Give Me All Your Luvin’"), não temendo governo, indústria fonográfica ou o próprio Vaticano. Sua fave tem composições tão diversificadas, caro hater de Madonna?

Esses são apenas alguns motivos pelos quais Madonna é um verdadeiro monumento da história da música. Talvez ela seja tão odiada por ainda ser relevante e fazer sucesso após 35 anos de carreira, sobrevivendo às pancadas do público, da indústria fonográfica e do preconceito de idade e sexo. Será que as suas cantoras favoritas ainda vão ser lembradas e relevantes daqui a dez anos? Ou vão ser atacadas de todos os lados por terem cometido o crime de envelhecer, até que desistam?
Ninguém é obrigado a gostar de Madonna, mas esse não é um texto baseado em gosto, e sim em fatos. Mesmo odiando a Rainha do Pop, é obrigatório reconhecer seu pioneirismo, sua ousadia e seu impacto, afinal, o pop como você conhece simplesmente não existiria sem ela. Por essa razão e por outras mais, Madonna está no mesmo patamar de Michael Jackson, Prince, David Bowie e Whitney Houston: não apenas grandes e rentáveis artistas, mas ferramentas de reconstrução do pop e parte fundamental da história da música.

Mas dessa vez, não espere que ela morra para valorizá-la.