Por Jorge Doria
Jornal O Globo
Jornal O Globo
Nas
redes sociais, a percepção do conflito no Oriente Médio custou ao Estado judeu
bem mais do que imaginam seus líderes
As
redes sociais estão mudando em tempo real a maneira como o longo conflito entre
Israel e Palestina é percebido. E o fluxo contínuo de informação e conversas
distribuídas por Twitter e Facebook custam a Israel mais em prestígio do que os
velhos políticos que comandam o país estão percebendo. Esta guerra já foi
perdida.
Quando
as Forças de Defesa de Israel invadiram Gaza, em janeiro de 2009, o Twitter
tinha por volta de 15 milhões de usuários ativos. O Facebook, 250 milhões.
Hoje, o Twitter tem 244 milhões e o Facebook, 1,28 bilhão. Naquele mês, 4% da
população mundial tinha um smartphone nas mãos. Hoje, um quarto de nós humanos
convivemos diariamente com o telefone que acessa a internet. Nele, usamos
principalmente as redes sociais.
Neste
conflito, como de hábito, há um nítido desequilíbrio entre os mortos. Morrem
muito mais palestinos. Em 2009, foram 1.400 de acordo com a ONU. Até o dia 27
último, também segundo a ONU, foram 999. Mas uma coisa são os números brutos.
Outra é ver gente morrendo. Principalmente crianças. Ainda assim, imagens de
mortes chegavam ao público pela imprensa tradicional. As redes mudaram esta
dinâmica.
Na
manhã do dia 16, o fotógrafo Tyler Hicks, do New York Times, viu incrédulo
quando uma bomba matou alguns meninos numa praia de Gaza. Registrou o que pôde.
Mas também, como inúmeros outros jornalistas vêm fazendo durante toda esta
operação, tuitou. Ao fazer a narrativa em tempo real de uma matança, os filtros
que buscam mais precisão e menos adjetivos, incorporados por qualquer jornalista,
baixam e a emoção aflora. As narrativas desta operação estão mais carregadas.
De certa forma, talvez representem melhor os horrores de uma guerra.
Em
guerras, porém, a primeira vítima é a verdade. A frase de um antigo ministro
britânico segue precisa. Dentre as muitas imagens e vídeos que circulam pelo
burburinho da rede, nem todas são de Gaza. É difícil, frequentemente, discernir
quais cenas vêm na verdade de conflitos muito mais sangrentos, como o da Síria.
Ou do que ainda ocorre no Iraque.
Assim
como nem toda informação que chega às redes circula com a velocidade dos
virais. John Reed, repórter do “Financial Times”, viu no dia 22 quando dois
foguetes foram disparados contra Israel. Partiram dos fundos do Hospital
al-Wafa que, depois, foi atacado. Os tweets com detalhes do bombardeio
israelense correram o mundo. Os iniciais, de Reed, tiveram menos repercussão. E
ainda renderam ao jornalista ameaças por simpatizantes do Hamas. Junto com a
informação, as redes carregam um segundo problema para Israel: conversas. É
onde a percepção de quem está certo ou errado se consolida. Em alguns casos,
estas conversas escorregam para o antissemitismo disfarçado ou escrachado. Mas
nem sempre. São conversas que estão ocorrendo mundialmente. E, perante as
imagens de crianças mortas, é difícil que terminem numa conclusão diferente:
não importa se tinha razão no início, Israel está matando inocentes demais.
É
isso mesmo que um grupo político radical com forte braço paramilitar como o
Hamas deseja. O Hamas, pois, venceu esta guerra. E a armadilha que armou para
Israel é feia por dois motivos.
Primeiro
porque fez com que a opinião pública mundial se voltasse contra Israel. Para
onde vai a opinião pública, para lá seguem os governos. Segundo porque,
conforme o mundo lhe vira as costas, Israel se fecha em copas. Reforça sua
impressão de que está sozinho contra todos e alimenta a máquina que derramará
mais sangue palestino. O ciclo se retroalimenta.