Que delícia foi testemunhar o último episódio de The Idol. Depois de quatro capítulos esquisitos, mas minimamente coerentes, a série da HBO comandada por Sam Levinson e Abel ‘The Weeknd’ Tesfaye encerrou-se esta semana finalmente evidenciando tudo que foi falado lá atrás.
Na realidade, não tudo: até hoje, a expectativa prometida de provocação, nudez extrema e torture porn nunca se concretizou. O que acontece é que, no último dos cinco episódios, The Idol prova de uma vez por todas que sim, as turbulências nos bastidores causaram uma embaralhada na trama - e a HBO não conseguiu montar um desfecho que faça o mínimo de sentido para a jornada de Jocelyn, Tedros, eu ou você.
Até agora todos os problemas de The Idol ficavam na superfície, mas não atrapalhavam a narrativa de fato. Por mais que os quatro episódios anteriores fossem rasos - e se prolongassem em cenas quase entediantes com visual de propaganda de perfume - fato é que uma história estava sendo contada. Era algo sobre a indústria da música e suas explorações (aprendemos aqui que todos são horríveis, claro); era algo sobre formação de cultos (apesar de não termos testemunhado a real formação de um culto); era algo sobre o desenvolvimento musical de uma estrela em estado de vulnerabilidade. Ok, isso deu para entender. O que ficava misterioso era para onde Tesfaye e Levinson estavam levando essa história. Seria possível que a conclusão era de que ao ser abusada Jocelyn se tornaria uma compositora melhor?
Para além do óbvio sexploitation, talvez essa busca por um propósito tenha mantido os espectadores semanalmente, para o que no fundo é uma narrativa ridiculamente rasa. Não é exatamente um problema que os mamilos de Lily Rose-Depp ganhem protagonismo de pelo menos cinco cenas por episódio - lá pelo fim do penúltimo, já era claro que isso seria parte da identidade visual de The Idol. Mas ao assumir uma produção que seria comandada por uma mulher e supostamente regravar 80% das cenas de The Idol, o que Levinson tem a oferecer além do discurso esperado e meio dúbio sobre a objetificação do corpo?
O que acontece no quinto episódio não pode ser justificado de outra forma que não uma seleção de recortes de cenas que chega a uma conclusão absolutamente surreal. Não apenas The Idol levantou bolas que nunca chegaram a ser cortadas - como a acusação inconclusiva de estupro do pobre Rob -, como realmente fez todo mundo mudar de opinião, personalidade e jornada em um piscar de olhos. Foi um caos repleto: aqueles quatro empresários do primeiro episódio, tão rígidos e impiedosos, foram colocados para assistir a um American Idol improvisado e acharam a apresentação lindíssima.
“Não há ninguém como eles!”, aplaudem e exclamam ao testemunhar os talentos de Chloe, Izaak e Ramsey. Será possível que eles nunca tenham visto qualquer programa de talentos? Sim, o mundo está repleto de bons cantores - eles não estão todos na casa de Jocelyn.
Nikki tem uma interação absolutamente injustificável com Tedros, que não leva a lugar nenhum, e Chaim faz um discurso risível sobre Chapeuzinho Vermelho (Hank Azaria, como tradição, resolve adotar um sotaque aleatório). É tudo tão ridículo que pela primeira vez The Idol se mostra realmente engraçado de assistir.
Depois de tudo isso, The Idol faz um avanço no tempo com direito a letreiro de “seis semanas depois” (apesar de não termos tido nenhuma noção real de tempo até então) e encerra-se em uma reviravolta completa que deixou muita gente até agora coçando a cabeça para entender. A conclusão muda acontecimentos do passado, relativiza as cenas de abuso e, no fim, contribui para o senso de despropósito do que assistimos, porque ele afinal joga no lixo a oportunidade de contar uma boa história sobre uma estrela que, aparentemente, tem habilidades de uma mente do crime. Mais do que isso, a produção da HBO escolhe que o melhor caminho, no seu leque de potenciais controvérsias, é realmente contar uma história de falsas acusações de abuso.
Durante toda essa jornada, é preciso dizer que Lily-Rose Depp sustenta Jocelyn com tudo que tem, e consegue, o que não deve ter sido fácil. Manter a mesma expressão de vulnerabilidade por cinco episódios de uma hora certamente deve ter sido cansativo, ainda mais porque a pobre atriz teve que contracenar tantas vezes com Tesfaye. Quieto, o cantor até vende a imagem de Tedros como um canastrão por natureza - mas sempre que ele precisa discursar, o ator beira o vergonhoso. Poucas pessoas se salvam aqui além de Depp, inclusive, mas mais porque a produção sempre nos faz questionar ‘o que raios essa pessoa foi fazer ali?’.
E afinal, a matéria da Vanity Fair? O que acharão os fãs de Jocelyn sobre sua última aparição? O que acontecerá com Rob? Porque vimos tanto de Leia, a personagem que veio para conturbar a carreira tão promissora de Rachel Sennott? Estas perguntas devem ficar sem resposta, porque, apesar de Da’Vine Joy Randolph dizer que a HBO está interessada no futuro de The Idol, a única narrativa que parece ter algo a acrescentar agora seria um documentário de bastidores para entender afinal que raios se passou por lá.
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