A
fase da adolescência é um dos períodos mais conturbados da vida de qualquer
garota. Cheia de pressões sociais, ela é cercada também pelas famosas
oscilações e transformações hormonais, que se apresentam na pele em espinhas
indesejadas, mudanças corporais que rapidamente deixam aquele corpo esguio e
sem forma como uma mera lembrança da infância e outras alterações que
interferem no humor e na rotina. Ser adolescente é um desafio, principalmente
no ambiente escolar.
E
com sua habilidade inerente e até mesmo blasé, Hollywood tem inserido esse
hiato da vida humana nos cinemas, em uma lista infindável de comédias teens
padrões onde o bullying, as líderes de torcida, os atletas juvenis bonitinhos e
todo esse esse contexto colidem entre si, em produções quase idênticas, que
trazem a mesma mensagem e que reforçam que se ser adolescente é difícil, nos
EUA deve ser um real pesadelo. E nesse gênero repleto de repetições e algumas
boas exceções como 10 Coisas que Eu
Odeio Você e Meninas Malvadas, a
Netflix lança Siera Burgess é uma Loser, uma crônica leve e simples, que mostra
os dois lados do high school, com uma pegada body positive que raramente se vê.
Quando
se trata de filmes teen, é comum que a personagem underdog se encaixe em algum
padrão de beleza. Embora na trama ela seja projetada para ser uma espécie de
"patinho feio", seus traços
finos, cabelos lisos quase alinhados e corpo magro apresentam uma protagonista
que talvez esteja usando as peças de roupa erradas. Em Sierra Burgess, Shanon Purser (a amada Barb de Stranger Things) vai na contramão e se
mostra como um extrato real de garotas genuínas existentes nos corredores da
escola.
Com
um formato plus size, suas curvas, cabelos ruivos cacheados e sardinhas
contradizem tantas produções do gênero e revelam uma caricatura bem realista de
como é ser uma adolescente cujos padrões estão bem aquém do esperado. Aqui, a
transformação de Sierra não está em uma espécie de makeover a la As Patricinhas de Bervely Hills em Tai
Frasier (Brittany Murphy). A maior
transformação da personagem está em aceitar o corpo com o qual nasceu e
enxergar a beleza em si mesma, sem se equiparar ao que as revistas de moda e
estilo comercializam. E esse é um dos desafios mais difíceis para qualquer
mulher, seja ela magra ou não.
E
à medida que a protagonista homônima tenta se encontrar, a trama - um tanto
simplista, mas coesa - apresenta a antagonista por uma ótica mais ousada. Se
desviando do estereótipo batido da líder de torcida maldosa, o novo longa da Netflix mostra as motivações de
Veronica (Kristine Froseth), uma
garota cuja criação afeta diretamente em seu comportamento doentio. Promovendo
uma empatia inesperada no público, a comédia romântica quebra o molde do gênero
ao cruzar um limite poucas vezes avançado. Ao explorar seus personagens para
além dos formatos comumente apresentados nos cinemas, Sierra Burgess é uma
Loser traz uma leveza surpreendente, em um filme que - ainda que não alcance a
sensibilidade maestral de Para Todos os
Garotos que Já Amei - é uma espécie de aconchego para as novas gerações que
percorrem diariamente os corredores das escolas. Ao transformar a personagem
título em um símbolo de representatividade para os tempos contemporâneos,
passamos a adequar os nossos olhos a um momento diferente, onde garotas plus
sizes de cabelos ruivos curtos cacheados também podem representar um ideal
identificável. Desviando-se dos modelos pré-estabelecidos, o filme é a
inspiração que a indústria do entretenimento precisava exalar.
Com
uma trilha sonora que emana synthpop pelos poros e tenta se inspirar levemente
nos clássicos de John Hughes como Gatinhas e Gatões e A Garota de Rosa Shocking, Sierra Burgess é uma Loser não é um
filme extraordinário, mas faz muito mais do que a maioria das comédia
românticas teens encontradas na praça. Ao trazer os conflitos que os longos
anos de body shaming na mídia e na sociedade geraram em garotas e mulheres que
sempre se projetaram em padrões de beleza inalcançáveis, a produção apresenta
uma nova perspectiva no gênero, se aprofunda em seus personagens como raramente
vemos nesses filmes e entrega uma mensagem body positive que, com certeza, vai
auxiliar a mudar a dura perspectiva que tantas meninas passaram a vida inteira
nutrindo sobre si mesmas. É representatividade que chama?
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