domingo, 13 de agosto de 2023

Crítica | "Close" faz retrato tocante da intimidade masculina jovem

Poucos cineastas conseguem reconhecimento tão cedo como o belga Lukas Dhont. Em 2018, aos 25 anos de idade, recebeu em Cannes o prêmio Câmera de Ouro de Melhor Longa-Metragem de Estreia por Girl, sobre uma garota trans que sonha em ser bailarina profissional. Agora, aos 31 anos e com o segundo longa, Close, o diretor chega ao Oscar com uma indicação a Melhor Filme Internacional. Uma nomeação muito merecida, uma vez que Close se prova como um dos dramas mais tocantes a estrearem neste início de ano nos cinemas brasileiros.

No filme, Dhont volta a abordar a juventude LGBTQIA+ ao nos apresentar dois garotos: Léo (Eden Dambrine) e Rémi (Gustav De Waele). Já nas cenas de abertura, fica evidente como a dupla tem uma intimidade muito bonita e fazem tudo juntos, desde brincadeiras de faz-de-conta, até passeios de bicicleta ou conversas soltas noite adentro. É uma amizade calorosa e encorajada pelas famílias de ambos.

Mas as dificuldades começam quando Léo e Rémi se mudam para uma nova escola, onde as crianças estranham o carinho compartilhado por eles. Ao contrário dos outros, Léo e Rémi não têm vergonha de se abraçarem ou de deitarem juntos na grama para relaxar e tomar sol. E assim começam a correr os boatos de que os dois são, na verdade, um casal.

Essa é a faísca do conflito central de Close. Léo e Rémi reagem de formas muito diferentes aos boatos: enquanto um parece não se importar tanto, o outro fica claramente incomodado. E com esse descompasso vemos como a relação começa a se desestabilizar, especialmente pela maneira como Léo e Rémi se recusam a falar sobre o problema. É uma incomunicabilidade que toma proporções cada vez maiores, até sair de controle e levar a um acontecimento que muda para sempre as vidas dos dois. Para evitar spoilers, não vou comentar esse episódio. Mas se trata de um ponto de virada importante para a trama. E, curiosamente, o filme nunca revela ao público os detalhes de como transcorreu esse evento. Em vez disso, Dhont passa o restante do tempo explorando as repercussões do ocorrido e como isso afeta as emoções dos personagens.

Para alguns espectadores, podem ser frustrantes a falta de comunicação entre as crianças e a ausência de informações sobre pontos importantes da trama, dando a impressão de estarmos vendo um filme emocionalmente travado. Mas isso não é um problema aqui, porque o objetivo de Dhont é falar sobre como jovens têm dificuldade em processar as fortes emoções da adolescência. Nessa fase da vida, muitos sentimentos de vergonha e raiva não são expressados verbalmente, mas sim extravasados de outras maneiras: com agressividade, distanciamento ou supressão. O foco dramático, portanto, não está no que é explícito, mas sim nas lacunas que os personagens deixam em meio à dor.

Quando aceitamos essa proposta, apreciamos como Close dá vida ao seu drama para além dos diálogos. Os gestos, por exemplo, ganham ainda mais importância, pois um abraço ou um empurrão podem revelar mais do que as falas. Também é impressionante a performance dos dois atores mirins principais. Mesmo quando não comunicam verbalmente o que pensam, entendemos perfeitamente como eles se sentem graças às mudanças nas feições e posturas corporais. É raro ver atores tão jovens dominarem com tanta destreza a expressão dramática puramente física.

A direção de arte também precisa ser elogiada. Em especial, graças ao uso de cores fortes, como o vermelho, o amarelo e o verde, seja nos figurinos, nos cenários ou nas flores em volta das casas dos garotos. São paletas que chamam bastante atenção, como se as cores tivessem de expressar, por meio da alta saturação, toda a intensidade emocional que os meninos não conseguem traduzir em frases.

E todos esses elementos são filmados com planos mais fechados, que nos aproximam dos corpos e dos rostos dos personagens. Junte isso a uma fotografia que usa muito bem a luz natural da primavera e você tem uma encenação intimista, capaz de nos fazer sentir de perto o calor de cada nuance da trajetória de Léo e Rémi.

Close faz, portanto, um retrato de enorme sensibilidade. Além de explorar as dores da adolescência, o filme traz uma perspectiva realista sobre o impacto da homofobia na mente de garotos descobrindo o amor e a intimidade masculina. Ao entender como esses jovens reprimem emoções, Dhont cria uma obra em que gestos, cores e silêncios falam mais alto do que palavras.

Se Lukas Dhont consegue fazer isso tudo no que é apenas seu segundo longa-metragem, com certeza ele merece ser reconhecido como uma voz promissora do cinema europeu contemporâneo. E se suas obras futuras forem tão comoventes quanto Close, teremos muito que celebrar, esteja o cineasta com um Oscar debaixo do braço ou não.

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