Malorie
está grávida de uma relação que já terminou e vive um momento de incertezas.
Como será sua maternidade? Deve manter a criança ou entregá-la para adoção?
Será que ela consegue – ou, será que ela quer? – incorporar o papel de mãe? A
artista plástica, no entanto, tem suas reflexões e suas dúvidas da maternidade
interrompidas quando, ao lado de sua irmã, Jessica, observa o mundo inteiro ir
à loucura.
Em
diferentes lugares espalhados pelo mundo, as pessoas começam a tomar atitudes
incompreensíveis. Expostas à luz, elas veem algo que ninguém sabe muito o que
é, mas que faz com que desejem a morte e se suicidem das maneiras mais
dolorosas, porém sem sentir nada.
A
instigante história criada por Josh
Malerman em seu best seller "Caixa
de Pássaros" chegou ao catálogo da Netflix na forma de um longa-metragem dirigido por Susanne Bier (das séries The Night Manager e The Undoing) e com roteiro adaptado por
Eric Heisserer, trazendo Sandra Bullock no papel da
protagonista.
Em
mais um belo trabalho de atuação, a atriz de "Gravidade" e "Um
Sonho Possível" incorpora brilhantemente a personagem que, antes
incerta de suas decisões e despreocupada ao lado da irmã, interpretada por Sarah Paulson, agora dá lugar a uma mãe
destemida, que vai lutar com unhas e dentes, de venda sobre os olhos e tudo,
para proteger sua prole.
Sandra Bullock consegue captar cada um dos diferentes momentos da
personagem, o que faz toda a diferença para retratar também fases distintas na
narrativa.
No
elenco ao lado dela, estão nomes como John
Malkovich, BD Wong, Trevante Rhodes, Rosa Salazar, David
Dastmalchian, Parminder Nagra, Machine Gun Kelly, Tom Hollander e Jacki Weaver,
que interpretam outros sobreviventes de um surto que fez com que boa parte da
população fosse dizimada da face da Terra.
Suspenses dos sentidos
Na
linha de Um Lugar Silencioso,
suspense pós-apocalíptico que foi o grande sucesso do gênero nos cinemas em
2018, "Caixa de Pássaros"
é outro filme que tem toda sua trama envolta nos sentidos. Enquanto o primeiro
se passa em um universo no qual qualquer barulho, mesmo os mais leves e
discretos sons, podem atrair criaturas assassinas, no segundo o responsável por
espalhar o terror é uma força desconhecida e que permanece nas sombras.
Tudo
o que os personagens – e o público – sabem é que não se deve abrir os olhos e
olhar para a luz. Como lidar com um inimigo que não tem rosto? O brilhantismo
do roteiro de "Caixa de Pássaros"
que é trabalhado também com primazia no livro, talvez de uma forma ainda melhor
elaborada nas páginas escritas, é justamente o mistério em torno do vilão. É
uma força magnética? Uma criatura invisível? Um ser sobrenatural?
Malorie
e os demais sobreviventes ficam, literalmente, no escuro. Para se proteger
contra os efeitos deste inimigo desconhecido, todos só sabem de duas coisas: É
preciso cobrir as janelas e bloquear qualquer entrada de luz e há uma única
forma de saber que algo se aproxima: os pássaros.
Para
garantir a subsistência, eles só conseguem sair de casa se estiverem vendados –
o que faz com que o filme se torne quase um "Ensaio Sobre a Cegueira", mas sem toda a dose de reflexão
sobre o mundo e a cegueira social proposta por José Saramago em seu livro/filme.
A
trilha sonora típica de suspense e a estética que trabalha muito em cima dos
jogos de luz e da iluminação indireta sobre os ambientes também contribuem para
ajudar a construir o clima do filme, que consegue envolver o espectador no
desenrolar da trama, contada de forma não linear, mesclando passado e presente
para, aos poucos, fazer com que o espectador entenda como Malorie chegou onde
chegou.
Mesmo
com todas as diferenças de linguagem entre os dois meios, o filme consegue se
bastante fiel à proposta da história original contada no livro de Malerman,
fazendo apenas algumas poucas e justas adaptações para tornar certos aspectos
mais ou menos evidentes, mas nada que cause estranhamento para os leitores mais
apegados à obra escrita.
Apesar
disso, no entanto, quem desfrutou cada uma das páginas do livro pode sentir
que, na tela, a história se desenrola apressadamente, quase demais. Alguns
fatos que consomem horas e horas de leitura e que, no livro, fazem com que os
espectadores percebam com muito mais intensidade a passagem do tempo, são
visitados muito brevemente no longa-metragem da Netflix – necessário, se a intenção era contar toda a história em
menos de duas horas, porém um pouco atropelado.
NOTA: 70
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