Em
The Iron Throne, GoT expõe fragilidade do roteiro
escrito por David Benioff e D.B.
Weiss após o fim dos livros de George
R.R. Martin.
Agridoce.
Foi assim que os roteiristas de Game of
Thrones definiram o final da série nos últimos anos, antes mesmo da escrita
da última temporada. Nesta segunda-feira pós-episódio é muito difícil concordar
com David Benioff e D.B. Weiss. Mas há um fundo de verdade
nessa definição. No sentido figurado, agridoce quer dizer alguma coisa que é ao
mesmo tempo agradável e desagradável. Em partes é assim o sentimento em relação
a The Iron Throne, o sexto e último
episódio de GoT: há algo agradável
(em alguns poucos enredos), mas, em sua maioria, o encerramento está mais para
o significado da parte “agri”, que
remete a amargo, ácido e azedo, do que de “doce”.
O
episódio final começa mostrando a devastação em Porto Real após a passagem de
Daenerys (Emilia Clarke) com Drogon,
os imaculados, os dothrakis e o exército do Norte. Os mortos, os feridos e os
escombros são apresentados pelo ponto de vista de horror nos olhos e nas
caminhadas de Tyrion Lannister (Peter
Dinklage), Jon Snow (Kit Harington)
e Arya Stark (Maisie Williams). As
mortes de Cersei (Lena Headey) e
Jaime (Nikolaj Coster-Waldau) são
devidamente confirmadas, assim como a tal “loucura”
de Daenerys, que ordenou a morte de qualquer um que tenha apoiado a rainha
Lannister, mesmo quem tenha se rendido.
Com
cenas lentas e com poucas falas, o capítulo avança para o discurso tirano de
Daenerys — um dos momentos mais bonitos do episódio quando se fala em visual.
Certa de suas atitudes, ela garante ao seu exército que a guerra não acabou e
vê seus aliados debandarem. O primeiro é Tyrion, que joga o broche de mão do
rei em desacordo com a Targaryen. Mesmo em dúvida, convencido por anão, Jon
entende que viva, Daenerys sempre será uma ameaça à paz e mata a amada em
frente ao Trono de Ferro, que depois é derretido pelo dragão Drogon, que deixa
Westeros com o corpo da mãe — outra bela cena.
Até
esse momento, o episódio segue uma lógica. Só que uma lógica estabelecida de
acordo com os acontecimentos da oitava temporada, que, ao longo dos seis
episódios, desconstruiu personagens de uma forma inimaginável. Depois de tudo
que Daenerys fez, devastando toda uma cidade e matando inocentes, era
impossível a personagem ser uma governante justa para Westeros. Assim como Jon,
que teve uma temporada apática, tinha que ter alguma missão no episódio final.
O problema maior vem com tudo que acontece depois.
O
episódio tem um pulo temporal. Tyrion e Jon são prisioneiros dos imaculados,
que, sob comando de Verme Cinzento (Jacob
Basil Anderson), dominam Porto Real. Diante de tudo que aconteceu e da
construção do personagem no episódio final, é difícil engolir que ele tenha
deixado a dupla viva, principalmente, Jon. E pior ainda, que aceite que Tyrion
seja julgado por um conselho formado pelos atuais lordes e ladys de Westeros.
Inclusive, o personagem faz questão de dizer no início da cena que são eles que
comandam Porto Real. No entanto, segundos depois, acata a ideia dos lordes de
ouvir — ninguém menos que o prisioneiro e traidor de Daenerys — Tyrion, que se
pronuncia após a recusa de uma democracia proposta por Samwell Tarly (John Bradley-West).
Cabe
ao anão dar a ideia de como Westeros deve ser governada. Ele se baseia no fato
de quem tem “a melhor história” entre
os presentes no conselho e propõe o nome de Bran Stark (Isaac Hempstead-Wright). Parte dos fãs de Game of Thrones já esperavam por isso, principalmente, porque o
enredo do Corvo de Três Olhos não foi bem explorado pela série em sua última
temporada. Em momento nenhum o seriado deu a devida importância ao novo “cargo” de Bran, que muita gente
acreditava ter a ver com o enredo do Rei da Noite e com a forma como o vilão
seria derrotado. Em partes, Bran fez sua parte entregando a adaga a Arya. No
entanto, esperava-se muito mais do personagem.
Apesar
de ser uma decisão especulada, colocar Bran como rei de Westeros, parece uma
solução incoerente com o próprio personagem, mais uma vez. Ao longo da série,
Bran falou diversas vezes sobre abdicar de ser Bran Stark e de tudo que isso
queria dizer: inicialmente, ser o lorde de Winterfell. Porém, na cena em
questão, ele acata a ideia de Tyrion porque, segundo ele, dizendo “não quero ser rei, mas é por isso eu que
estou aqui”. Qualquer um que tenha prestado atenção ao enredo de Game of Thrones, percebe que isso não
tem a menor lógica. E mostrando ser a única personagem sensata no conselho,
Sansa Stark (Sophie Turner) pede a
independência do Norte.
Também
cabe ao tal conselho decidir o futuro de Jon, que volta ao seu ponto inicial
sendo mandado para um exílio na Patrulha da Noite. Ou seja, de nada adiantou
ser um Targaryen, que foi o principal segredo e teoria da série durante anos,
nem ter tido suas vitórias — mesmo que não a principal — contra os white
walkers. Assim como Daenerys, Jon viu sua trajetória de herói ser rebaixada
para um final fraco, que até poderia ter sido “ok” se fosse uma decisão do próprio personagem, que naturalmente
não queria o Trono de Ferro e que estava arrependido de ter matado a amada
Daenerys.
Com
isso estabelecido, a série foi destrinchado os finais dos personagens que
sobraram. Brienne de Tarth (Gwendoline
Christie) escreveu a história final de Jaime Lannister e seguiu os passos
do amado se tornando a principal integrante da Guarda Real; Tyrion se manteve
no cargo de mão do rei; Bronn (Jerome
Flynn) ficou com Jardim de Cima e se tornou o responsável pelas finanças de
Porto Real; Davos Seaworth (Liam
Cunningham) virou Mestre dos Navios; enquanto Samwell é o meistre.
Para
além de Porto Real, Sansa é coroada rainha do Norte, Jon chega até a Patrulha
da Noite e guia o povo livre para além da Muralha — agora com Fantasma de volta
(outra cena que vale, pelo menos para redimir o abandono há alguns episódios) —
e Arya sai de navio para descobrir o que existe a Oeste de Westeros. Três
finais até pertinentes com o que cada um dos personagens viveu no episódio
final, apesar de, como dito anteriormente, o desfecho de Jon ter sido muito
abaixo à jornada do personagem.
Com
tudo isso exposto, dá para dizer que a conclusão de Game of Thrones foi incoerente com o enredo das outras sete
temporadas negando tramas vendidas como importantes e a construção de
personagens. Apesar disso, de certa forma, ela é coerente com as (péssimas)
decisões da oitava, que teve falhas no desenvolvimento dos personagens — tendo
vários desconstruídos e não na forma positiva como a palavra é empregada nos
dias de hoje –, além de resoluções fáceis e preguiçosas de enredos. Uma mistura
dos finais de Lost (preguiçoso) com de How
I met your mother (incoerente com o principal enredo da trama).
A
impressão que fica é que, sem o apoio do roteiros nos livros de George R.R. Martin, Game of Thrones se perdeu. Tentando
sair do óbvio, os roteiristas fizeram um final sem sentido. Até porque aqui a
surpresa, uma das características mais celebradas de GoT, foi feita sem ter um
desenvolvimento pertinente. Quando o roteiro de Martin mata Ned Stark (Sean Bean), o protagonista óbvio na
primeira temporada, isso tem uma justificativa, assim como todas as outras
decisões surpreendentes do autor, seja o Casamento Vermelho, seja o Casamento
Roxo. E foi exatamente isso que faltou na oitava temporada: explicações que
derrubassem os indícios mostrados anteriormente, como, por exemplo, a de que
Jon e Daenerys eram os grandes heróis da trama e de que o Rei da Noite era a
grande ameaça aos Sete Reinos, isso só para citar dois arcos.
A
série não merecia as últimas temporadas. Era genial, um produto pop sem
precedentes. Que seguia um ritmo próprio, sem fan service, sem estratégia
batida de roteiro. #GameofThrones era genial porque entregava pro público o que
o público nem sabia que queria.